Ciclo completo de polícia: uma necessidade e seus entraves.
Recentemente,
fui informado sobre um site e uma
página no Facebook chamados “Todos contra o ciclo”. Essa
página, de autoria anônima, mas compartilhada especialmente por membros da
categoria dirigente da Polícia Civil, estaria realizando uma campanha contra a Proposta de Emenda à Constituição 431/2014,
de autoria do deputado federal Subtenente Gonzaga (PDT-MG), que estabelece o ciclo completo de polícia
para todas as polícias previstas no Artigo 144 da Constituição Federal (polícias
militar, civil, federal e rodoviária federal). O ciclo completo permitiria que
essas instituições realizassem o policiamento investigativo e também o
ostensivo uniformizado.
Charge encontrada no artigo "Polícias em guerra: PM x PC", da APPMARESP |
A estratégia da
página é, principalmente, denunciar ações violentas da Polícia Militar, enfatizando
especialmente os problemas ocasionados por seu caráter militar. Segundo a página,
que nomeia a Proposta de “PEC da Chacina”, seria muito ruim para a sociedade se
uma polícia militar tivesse o direito de “investigar civis e seus próprios
crimes”. Ainda segundo a página, “ciclo
completo, só para uma polícia unificada e desmilitarizada”.
Passamos às
considerações:
É muito importante que sejam denunciados os erros
cometidos por qualquer instituição pública, especialmente os das instituições
policiais, que cuidam dos bens mais preciosos dos indivíduos e da sociedade:
vida, liberdade, patrimônio e demais direitos e garantias. Fazê-lo
parcialmente, denunciando apenas uma instituição, pode parecer estratégico, mas
torna a crítica pouco efetiva. Sem dúvida, há um problema sério em relação à
política de segurança no país, uma segurança pública sob a lógica do combate
bélico militarizado. E essa política não atinge apenas as polícias militares,
mas todas as instituições do sistema. Segundo o delegado da Polícia Civil do
Rio de Janeiro Orlando Zaccone, no seu livro em que trata da “forma jurídica da
política de extermínio de inimigos na cidade do Rio de Janeiro”,
“A
violência policial não é um erro de procedimento de alguns policiais
despreparados. É uma política de Estado no Brasil, que recebe o apoio e o
incentivo de parcela da sociedade”.
Esse mesmo
delegado, ao comentar a atual situação jurídica dos chefes de polícia civil, em entrevista, afirma
categoricamente:
Hoje
os delegados não sabem se estão ligados ao mundo jurídico ou ao mundo policial.
[...] Se vinculam ao mundo jurídico quando estão discutindo a questão salarial,
reivindicando um salário equivalente ao de juiz, por exemplo. Mas, ao mesmo
tempo, quando se trata da posição de comando da polícia, não abrem mão dessa
função. [...].
Mas
se nós não decidirmos se somos vinculados ao mundo jurídico ou se somos
policiais, quem sai enfraquecida dessa indecisão é a Polícia Civil.
O mesmo pode ser
dito dos oficiais de polícia militar de alguns estados da Federação. Em busca
de reconhecimento, pensam ser a carreira jurídica o local mais adequado para encontrá-lo.
Não creio que seja. É preciso valorizar a carreira policial, que vai desde o
policial da base até o chefe da instituição.
Sobre o ciclo
completo de polícia, penso que é um dos passos para a modernização de nossas
instituições policiais. O trabalho dividido faz com que se desperdice recursos
e tempo, além de gerar uma desnecessária competição entre as instituições, o
que dificulta a cooperação e o compartilhamento de informações. Quem sai
perdendo dessas lutas por posições de poder é a sociedade, que tem, na verdade,
“meias polícias”.
No entanto, não
poderia deixar de afirmar que é uma temeridade a adoção do ciclo completo como
medida isolada, como quer a PEC 431/2014. É preciso uma revolução completa, com
o fim do paradigma militarista da segurança, para que tenhamos um bom sistema de
segurança pública. Neste ponto, concordo com o cabo Elisandro Lotin de Souza,
presidente da Associação Nacional de Praças (Anaspra) e da Associação de Praças
de Santa Catarina (Aprasc), para quem é necessário definir também a jornada de
trabalho dos policiais e desvincular a polícia do Exército. Além disso, segundo
ele:
Em suma, o ciclo
completo de polícia é importante, é o mínimo que se espera de qualquer polícia,
mas não pode vir de forma isolada. É preciso uma transformação completa no
modelo de segurança pública, com a rejeição total do atual paradigma
militarista de guerra, que só causa morte e violências. Acredito que as polícias devem ser desmilitarizadas, de carreira única e realizando ciclo completo. A democracia precisa
ser efetivada na política e nas instituições de segurança pública do Brasil.
excelente texto. Expõe bem a visão dos dois lados. Concordo que o Ciclo Completo precise de mais debates, mas sou defensor de um Polícia Militar mais autônoma.
ResponderExcluirO que o contribuinte paga é quer é algo que funcione. Se desmilitarizar fosse receita de sucesso, teríamos as policias civis como exemplo de eficácia e efiencia. Mas não é. Ao contrário, mal conseguem esclarecer os furtos simples que aportam todos os dias na delegacia quanto mais as dezenas de tipos penais. A solução seria a autonomia administrativa pra cada ente e a sua respectiva assembleia decidir quais modelos servem ao seu cidadão.
ResponderExcluirPor isso que o ciclo completo por si só não resolve o problema da segurança pública, como bem explorado no artigo. Tanto na PC quanto na PM precisam de mudanças além, ou seja, as duas precisam com que o Congresso institua o ciclo completo para o policial (PEC 51/13, 73/13, 361/13 e outras), entrada pela base até chegar a chefia, modernizar o modelo de apuração de crime, como proposto pelo PL 7402/14 que moderniza a investigação criminal. O artigo mostra só a ponta do iceberg. Ressalta-se que as polícias alienígenas que têm altos índices de eficiência nenhuma possui a estrutura jabuticaba brasileira. O povo merece e precisa urgente dessa reforma.
ExcluirCiclo completo, carreira única e desmilitarização são temas que precisam ser popularizados. Com a população bem informada, poderemos ter o seu apoio.
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