Existe relação entre racismo e segurança pública?
Algumas vezes, quando escrevemos
ou falamos sobre um problema já existente, somos apontados como sendo aqueles
que o criaram. Quando é desenvolvido um pensamento e são estabelecidos os
conceitos, começam a surgir as acusações. Fica parecendo que não havia qualquer
questão até falarmos.
É o caso do racismo no Brasil e
sua relação com a segurança pública. Basta citar essa relação (como ouvi
recentemente alguém criticando a suposta aleatoriedade das revistas em aeroportos) para
alguns dizerem que antes dessa “turma de esquerda” aparecer não havia nada
dessa luta de raças que foi criada ou esse “mimimi”. O passo seguinte é citar a
lei como fonte de imparcialidade ou mesmo a neutralidade das estatísticas para
dizer que os negros são mais abordados ou presos porque cometem mais crimes,
desconsiderando não só os processos objetivos de criminalização seletiva, como
também aqueles subjetivos, ou seja, a visão estereotipada e muitas vezes
despercebida do que é um “criminoso”, geralmente identificado como negro e
pobre.
Ninguém precisa ser negro para
entender que o Brasil é um país racista. Inúmeras pesquisas de negros e não negros,
além dos relatos e testemunhos de quem sofre diariamente, estão aí para
mostrar. Pesquisas feitas aqui e no exterior sobre criminalização seletiva,
racismo institucional e racismo de Estado dão conta das opressões que atingem
as minorias étnicas em vários campos sociais, inclusive na segurança pública.
Essa relação entre racismo e
segurança pública fica bem explicitada no excelente documentário “A 13ª Emenda”,
que demonstra como o sistema penitenciário dos Estados Unidos, país conhecido
como a “terra da liberdade”, é uma continuação do sistema de escravização do
negro afro-estadunidense, o que faz da população carcerária daquele país a
maior do mundo. Obviamente, a polícia acaba sendo utilizada como ferramenta nessa
estratégia.
Cartaz do filme A 13ª Emenda - Disponível na Netflix |
Por falar em cinema e racismo, lembram
do Oscar do ano passado, com poucas indicações de negros? Pois é, depois dos
protestos, houve várias indicações para este ano, inclusive com o vencedor de
melhor filme, Moonlight, sobre um jovem negro gay. Se isso não é de fato uma
mudança estrutural de pensamento, é pelo menos o resultado das lutas assimilado
pelo mercado capitalista cinematográfico. Que seja, ainda assim é um avanço.
No Brasil, que carrega o peso
histórico de ter sido um dos últimos países a abolir a escravidão, não é tão
diferente. (veja lista de países por abolição da escravidão aqui). Apesar da alegação de sermos uma “democracia
racial”, sabemos que não é isso que ocorre. Os negros e pobres são os que mais
morrem, os que lotam as nossas prisões e que sofrem cotidianamente com o
racismo na sociedade, sentido inclusive no tratamento dispensado pelas instituições
estatais, entre as quais as de segurança pública.
Afirmar isso, sendo ou não
policial, não é chamar os policiais de racistas (até porque a a maioria dos
policiais brasileiros faz parte dessas minorias raciais), mas entender o papel da instituição policial
em uma estratégia de perseguição e opressão de minorias raciais em detrimento
de outra, considerada majoritária não pelo quantitativo numérico, mas pela
hegemonia política, econômica e simbólica. Tentar deslegitimar quem afirma isso
e luta contra o racismo, como lutam vários negros e não negros, inclusive policiais, é um desserviço à sociedade brasileira.
Um diálogo que merece toda nossa atenção e respeito, pois cutuca uma ferida aberta em nossa sociedade, o policial pensador está de parabéns por chamar ao esclarecimento e ao debate tema de tamanha relevância.
ResponderExcluirUm diálogo que merece toda nossa atenção e respeito, pois cutuca uma ferida aberta em nossa sociedade, o policial pensador está de parabéns por chamar ao esclarecimento e ao debate tema de tamanha relevância.
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