Filmes para pensar: Robocop e a polícia de nosso tempo.
O filme Robocop (dirigido por Paul Verhoeven, EUA,
1987) tornou-se um clássico do cinema dos anos 80, especialmente por combinar
ficção científica e crítica social e política em tempos desenvolvimento
científico e econômico dos Estados Unidos, com a expansão do neoliberalismo
como doutrina dominante no ocidente. Neste artigo, o Policial Pensador tenta identificar no
filme lições para os nossos dias, especialmente no tocante à polícia e à
segurança pública.
A estória do
filme é ambientada, em um “futuro próximo”, não sendo datada com exatidão. Neste
futuro, a cidade de Detroit, Estados Unidos, está dominada por criminosos, pelo
menos em sua parte mais pobre. Um grande conglomerado empresarial chamado OCP (Omni Consumer Products) está se expandindo
através da exploração econômica de áreas antes consideradas “não-lucrativas”,
tais como saúde, segurança pública e defesa militar. A polícia também é
controlada pela grande empresa.
Nesse
contexto e em meio a lutas internas na OCP, o projeto de criar robôs policiais
dá lugar ao projeto Robocop, um
ciborgue que contaria com tecidos humanos integrados a circuitos mecânicos e
inteligência artificial. Como os corpos dos
policiais passavam a ser “propriedade” da empresa, quando o contrato de
admissão era assinado, faltava apenas encontrar um “voluntário”, o que foi
possível após os graves ferimentos do jovem Alex Murphy, um policial dedicado
que praticamente morreu em serviço.
Estava, então, desenhado o quadro do filme. No cenário mórbido de uma polícia controlada por
uma empresa, cujas relações trabalhistas estavam cada vez mais precárias, os
policiais entram em greve ao mesmo tempo em que Robocop é colocado em serviço nas ruas. A ação do ciborgue é
violenta, mas sempre autorizada quando se dá contra os pequenos delitos
ocorridos na cidade.
O drama pessoal
de Robocop começa quando ele percebe
que é uma vítima do próprio sistema do qual faz parte, que envolve política,
polícia, crimes e objetivos empresariais. Ele é mais uma peça da engrenagem em
que os mais poderosos criminosos, justamente os que assassinaram Alex Murphy, são
ligados aos mais altos executivos da OCP e ao próprio governo da cidade. Mesmo após
solucionar o próprio homicídio e executar o principal responsável pela rede
criminosa-empresarial, a impressão é de que o “herói” permanece triste,
justamente por encontrar sua humanidade em meio aos seus circuitos. Uma
tragédia.
O filme
traz, portanto, um aviso para nossa época: políticas de tolerância zero, com
adoção de modelos e paradigmas empresariais nas instituições públicas,
especialmente na polícia, são extremamente prejudiciais, tanto para os próprios
policiais, que tem seu trabalho precarizado e explorado, como para a própria
cidade, que passa a sofrer com a violência exagerada desse tipo de abordagem
policial que, em suma, não afeta aos grandes criminosos, cujas relações com os
políticos são cada vez mais presentes. Neste sentido, basta lembrarmos dos
chamados “crimes de colarinho branco”. Da mesma forma, a crença exagerada na
tecnologia é um grande perigo, especialmente se for colocada em detrimento dos
policiais. Ocorre, em algumas polícias, a tentativa de transformação de
policiais em máquinas, com carga horária excessiva, exigências descabidas e
desrespeito a direitos. Em suma, tenta-se transformar homens e mulheres em robocops da vida real.
O filme é
tão atual que foi celebrado com um Remake
em 2014, tendo como diretor o brasileiro José Padilha, conhecido por seu
trabalho em Tropa de Elite I e II. Em comum, Robocop e Tropa trazem heróis policiais atormentados, especialmente
quando percebem que fazem parte do sistema que pensam combater.
Que o alerta
de Robocop permaneça vivo. Não
queremos uma sociedade de controle dominada por empresas, em que o consumo
convive com um estado policial de exceção. Sonhamos com uma sociedade livre,
onde seja sempre possível resistir ao máximo aos imperativos capitalistas e
escapar, sempre que possível, dos tentáculos do sistema de dominação.
Assista
aqui, Robocop:
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