Rio de Janeiro: laboratório de um modelo falido de segurança pública
A morte da menina Maria Eduarda, de 13 anos, atingida por uma “bala perdida” enquanto praticava educação física dentro da escola,
é um triste exemplo da sucessão de tragédias vista nesta última semana do mês
de março, que mostram o fracasso do modelo de segurança pública que se utilizou
no estado do Rio de Janeiro ao longo de uma década.
Essa constatação de fracasso não é uma novidade. Desde
o início da implantação das Unidades de Polícia Pacificadora, em 2007,
alguns estudiosos já alertavam para aquilo que os moradores das periferias atingidas
por essas políticas perceberam muito cedo e que agora é tornado público. Destaco
aqui uma fala da professora Vera Malaguti Batista,
daquele mesmo ano, por ocasião dos jogos Pan-Americanos:
Há
um projeto notório de limpeza social, criando assim uma ilha da fantasia. Deixa
uma parte da cidade lustrosa. Então, o Pan é um grande momento de uma
"pacificação truculenta", que não vai dar certo.
A conclusão a que se chega é de que as políticas de
segurança pública que se desenvolveram experimentalmente no estado do Rio como
se lá fosse um laboratório, e tomadas por alguns como exemplo para o restante do
país, foram, na verdade, uma maquiagem para o estado durante os grandes eventos
esportivos internacionais que ocorreram: Copa do Mundo em 2014 e Jogos
Olímpicos em 2016. As terríveis consequências para a população mais pobre
daquele estado são vistas atualmente.
Capa do Jornal Meia Hora do dia 31.03.2017 |
Desde 2014, os números da letalidade policial não
param de crescer. Em 2016, o número de pessoas mortas pela polícia foi de 920,
ao tempo em que 115 policiais foram mortos no mesmo ano. Além disso e de forma igualmente
grave, somente neste ano de 2017, 46 policiais morreram no estado, sendo que
apenas nos meses de janeiro e fevereiro 182 pessoas foram mortas durante intervenções
policiais, segundo a Anistia Internacional.
O atual prefeito da cidade do Rio, que hoje fala em
blindar escolas municipais como forma de resolver o problema, é o mesmo que disse em sua campanha para
governador, em 2014: “Para cada policial morto, vamos formar mais 10”,
expondo a lógica sinistra do seu jogo biopolítico. A sensação que se tem é a de
que os governos estão utilizando essas vidas como se fossem peças descartáveis,
o que faz com que policiais matem e morram de forma absurdamente cotidiana.
Essa guerra estúpida, que alguns insistem em reduzir a
uma batalha do bem contra o mal, não tem dado qualquer resultado de diminuição
da violência ou mesmo do chamado “tráfico de drogas”. Pelo contrário, vemos que
as facções que controlam a venda de drogas tornadas ilícitas continuam fortes no
estado e a atividade, enquanto ilícita, permanece como lucrativo suporte para outras
atividades criminosas.
Talvez por isso o delegado de Polícia Federal e
ex-secretário de segurança pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, apesar de ter passado 10 anos comandando todas essas políticas mortíferas, tendo deixado a
função só após os jogos olímpicos, afirmou em uma entrevista recente:
“Quanto mais cidadania você der para as pessoas, menos polícia você precisa”, posicionando-se
de forma favorável a uma política de regulamentação e controle das drogas tornadas
ilícitas. Teria ele se arrependido de ser o representante daquelas políticas que acentuaram a criminalização e o extermínio da juventude pobre e negra?
O Rio de Janeiro, especialmente o Rio de Janeiro
pobre, agoniza com a “guerra às drogas” e a militarização da política de segurança pública.
Sem Comentario to " Rio de Janeiro: laboratório de um modelo falido de segurança pública "