Preto Zezé do outro lado da farda, contra os palhaços Titãs
Um palhaço fala em tom estridente:
“Você também é explorado!”. Assim, a palavra de ordem bradada em manifestações
populares é assimilada pela máquina capitalista e se transforma em refrão da péssima
canção dos Titãs, “Fardado”.
Ao contrário dos velhos playboys,
que fizeram sucesso nos anos 80 e que agora tentam se revender com a imagem de
rebeldia, o Rapper cearense Preto Zezé, com sua canção “Do outro lado da
farda”, não fica na miopia de ver apenas a farda ou o fardado. Morador da
favela, ele sabe que pedir ao policial, “ponha-se no meu lugar”, como querem os
Titãs, é mostrar-se apartado daquela realidade, na qual o jovem negro e/ou
pobre tem como principais formas de ascensão social ser um soldado do tráfico
ou soldado de polícia, dentro do contexto perverso da “guerra às drogas”.
Preto Zezé enxerga mais: Ao ver
“do outro lado”, consegue atravessar a farda com múltiplas visões,
experimentando um novo lugar. Sabe que o papel do fardado é “manter a ordem
injusta”, “sem dor ou sentimento”. Mas sabe que para isso este mesmo policial
sofre “exploração e humilhação do princípio ao fim”.
Enquanto os cinquentões tentam agradar em uma música com batida ruim e câmera
frenética no clipe em que aparecem vestidos de palhaços – reconhecidamente a
imagem que presos tatuam no corpo para mostrar que são matadores de policiais
–, Preto Zezé consegue fazer poesia política complexa com um ritmo simples,
qualidade de rappers e de emboladores, seus correlatos nordestinos. Essa voz da
favela, ao contrário dos palhaços, sabe que “ninguém consola a família de um PM
no velório” e que a missão policial toma feições suicidas em uma “democracia de
fachada”. Nas ruas e para a gestão da (in)segurança pública, “policial tombado
ou civil morto” é apenas estatística.
Preto Zezé (Foto: CUFA) |
Preto Zezé mostra que a favela
está viva e mais pensante do que nunca. Não faz um mero esculacho míope à
polícia, como fazem os Titãs, como também não compõe uma ode à polícia. Sua
canção é a elegia de nosso sistema, uma arma potente e uma crítica efetiva que
muitos intelectuais e militantes ainda não conseguiram fazer.
Para ouvir “Fardados”, acesse: http://www.youtube.com/watch?v=vt62Nc1hr2Q&feature=kp
Para ouvir “Do outro lado da
farda”, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=ZRhwpWToyik
Interessante esta confrontação de ideias. Enquanto os Titãs continuam a exigir dos policiais mesmo sabendo de sua condição de explorados, o Preto Zezé teve a sensibilidade de perceber o lado humano daqueles que carregam nos ombros a impossível missão de estabelecer paz e justiça num mundo de valores invertidos e transvestidos.
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